Festa, feira e reforma agrária juntam campo e cidade no Centro do Rio do Janeiro
quarta-feira 10 dezembro 2014 - Filed under Notícias do MST Rio
Terminou nesta quarta (10) a 6a edição da Feira Estadual da Reforma Agrária Cícero Guedes. Evento chama a atenção à necessidade da reforma agrária no dia internacional dos Direitos Humanos.
por Alan Tygel
Coco, abacaxi, aipim, jiló, quiabo, batata doce, milho, abobrinha, berinjela, limão, pimentão, pães, bolos, doces, pamonha, tapioca, leite, queijo, laticínios, café, cachaça, graviola… A lista é grande, assim como foi grande a VI Feira Estadual da Reforma Agrária Cícero Guedes. Cerca de 150 camponesas e camponeses ocuparam o Largo da Carioca durante 3 dias para comercializar mais de 70 toneladas de produtos vindos dos 17 assentamentos de reforma agrária do estado do Rio de Janeiro, e também de Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
A feira é organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em parceria com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), e com apoio do Sindipetro-RJ. A tenda de 500 m2 montada no Largo da Carioca atraiu a atenção de aproximadamente 70 mil pessoas durante os três dias. “A receptividade das trabalhadoras e trabalhadores do centro do Rio é muito grande. O pessoal já está acostumado com a feira, e sempre nos pede para fazermos ela mais vezes aqui”, afirma Marina dos Santos, da coordenação do MST.
Neste sentido, o MST vem dialogando para que a feira seja reconhecida como de interesse cultural e social da cidade do Rio de Janeiro. Andreia Matheus, coordenadora da feira, avalia que ela cumpriu seu papel: “Conseguimos mais uma vez fazer o diálogo com sociedade carioca, que é o nosso objetivo principal. Viemos mostrar para o povo da cidade quem é que produz os alimentos saudáveis que chegam na nossa mesa, e é por isso que a Reforma Agrária tem que ser uma luta de todos”, afirma.
No estado do Rio de Janeiro, o MST está presente em 17 assentamentos distribuídos nas Regiões Norte, Sul e Baixada Fluminense, além Região dos Lagos. E é de lá que vem a produção 100% agroecológica do Assentamento Osvaldo de Oliveira, um dos mais recentes do RJ. Mesmo antes de completar um ano com a posse da terra, os assentados trouxeram frutas, feijão e milho produzido com sementes crioulas. Hoje, praticamente toda a produção industrial de milho no Brasil é transgênica, contém altas doses de agrotóxicos e causa diversos problemas de saúde.
A Reforma Agrária e o Direito Humano à Alimentação Saudável
No dia Internacional dos Direitos Humanos, Marina dos Santos vê a luta pela terra como parte da luta por direitos humanos: “Para ter direito à terra e à alimentação saudável, é só com luta, organização e muita resistência. Por isso fazemos a nossa feira sempre no dia 10 de dezembro. O agronegócio nos nega o direito à alimentação saudável, e quem produz alimento saudável são as camponesas e camponeses deste país”, comenta.
Dentro das estratégias da Reforma Agrária Popular defendida pelo MST, as cooperativas e agroindústrias dos assentamentos cumprem um papel fundamental no fortalecimento da luta camponesa. Estiveram presentes na feira 3 cooperativas do Rio de Janeiro: Coopaterra, da Baixada e Sul Fluminense, e Coopscamp e Coopamab, do Norte Fluminense. De Minas, vieram a Cooperarca, da Zona da Mata, e Asfapsul, do Sul de Minas. Do Sul, vieram os laticínios da Cooperoeste, de Santa Catarina, e o suco de uva da Cooperativa de Sucos Monte Veneto. O Espírito Santo também participou com as Cooperativas Coopalmares e Coopterra, de São Mateus.
Assim como o projeto da Reforma Agrária Popular não se restringe à luta pela terra, a feira também debateu outros assuntos trabalhados pelo MST. O Setor de Saúde trouxe os produtos fitoterápicos e cosméticos feitos de plantas e raízes, enquanto o Setor de Educação esteve presente com cartilhas e materiais sobre a Educação do Campo. Os coletivos de jovens de Campo Alegre, e de mulheres, vindas de Campos dos Goytacazes conversaram com a sociedade sobre os desafios da juventude e das mulheres do campo. Também estiveram presentes a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, que faz a denúncia do uso de agrotóxicos no agrotóxicos e também pauta a agroecologia como forma de superação do capitalismo no campo.
No mesmo campo da defesa da agroecologia e agricultura camponesa, organizações como o Movimento dos Pequenos Agricultores e a Articulação de Agroecologia do Rio de Janeiro trouxeram seus produtos para a feira. O destaque foram as bananas e hortaliças produzidas em Vargem Grande, na cidade do Rio de Janeiro, fortalecendo o movimento de agricultura urbana.
Atrações culturais
Para fazer jus ao termo agri-cultura, a cultura da terra, não faltaram atrações musicais para balançar quem passava pelo Centro do Rio. O xote e o baião vieram pela sempre presente voz de Geraldo Junior e seu trio, enquanto o grupo Maracutaia fez Recife aterrissar na cidade. Us Neguin Q Ñ C Kala, parceiros de muitas feiras, cantaram seu rap de luta mostrando a unidade entre o campo e cidade. O tão criminalizado Funk também teve vez, mostrando que não só é música de favelado, mas também é de Sem Terra. O bloco da APAFunk, e os Mcs Pingo e Mano Teko representaram o ritmo de resistência da cidade, e não deixou ninguém parado.
Trazendo mais elementos culturais, a Cooperativa Jataí e a Editora Expressão Popular ofereceram livros a preço populares para formação política, porque a dimensão da formação também faz parte da Feira da Reforma Agrária. Oficinas sobre Saúde pela Terra, Mulheres e Agroecologia, Agricultura Urbana, e sobre a conjuntura de luta do Rio de Janeiro cumpriram um importante papel.
No encerramento da feira, a simbologia escolhida foi justamente a ligação campo-cidade, reforçando a urgência da união entre todas e todos os trabalhadores. Cada camponês e camponesa depositou um produto representativo de sua região em duas cestas, que foram entregue a dois trabalhadores da cidade: o gari Igor, e a profissional de limpeza Elisângela.
Ato lembrou as origens da Feira da Reforma Agrária no estado do RJ. No final dos anos 1990, em Campos dos Goytacazes, Cícero Guedes e os demais Sem Terra da região faziam semanalmente doações de alimentos no centro da cidade para mostrar a importância da reforma agrária para toda a população. E prestes a completar 2 anos do assassinato de Cícero, sua memória continua presente na luta dos Sem Terra. Além de dar seu nome à Feira, seu sítio Brava Gente segue sendo cultivado pelos filhos Ruth e Matheus, e a produção enchendo barrigas, corações e mentes de quem conhece sua história.
2014-12-10 » alantygel