Assentamento PDS Osvaldo de Oliveira: exemplo de luta e resistência na produção agroecológica e na construção da Reforma Agrária Popular
quinta-feira 21 dezembro 2017 - Filed under Notícias do MST Rio
por Nivia Silva, do MST
No dia 28 de fevereiro de 2014, em frente ao Fórum de Macaé, famílias esperavam ansiosas a decisão do juiz. Todos estavam preocupados com a demora. Alguns companheiros diziam: “A gente tem que ter fé que é hoje que sai essa terra!”. Outros diziam: “Nós só vamos sair daqui com uma decisão a nosso favor!” Era muita fé e coragem em jogo. E quando saiu a noticia foi àquela explosão de alegria, muitas bandeiras vermelhas tremularam, muitas lagrimas de felicidades rolaram aquele dia também. Eram muitos gritos e palavras de ordem, tantos que emocionavam.
“MST! A LUTA É PRA VALER!”
“REFORMA AGRÁRIA QUANDO? JÁ!”
“REBELDIA NECESSÁRIA, PRA FAZER REFORMA AGRÁRIA!”
“OSVALDO DE OLIVEIRA, SEU SONHO AINDA VIVE, LUTAMOS TODOS JUNTOS POR UMA PÁTRIA LIVRE”
Finalmente na terra, na tão sonhada terra! Fazenda Bom Jardim… Fazenda Bom Jardim que nada, agora é PDS Osvaldo de Oliveira! Primeira experiência deste tipo no estado do Rio de Janeiro. Que grandiosa vitória para todas essas famílias!
Hoje, passados três anos, é visível o sucesso nas iniciativas em torno da produção agroecológica com feijão, milho, abóbora, mandioca e banana. Houve também grande avanço na desafiadora organização do trabalho coletivo, a formação do coletivo de Mulheres Margarida do Carucanko, além da comercialização institucional através do PNAE, e na venda direta nos circuitos das feiras locais. No campo da formação, houve avanços na educação em agroecologia e saúde. Em fim muitas experiências.
Atualmente o assentamento vive o grande desafio de construir o planejamento e a execução da organização produtiva e ambiental de toda a área. É necessário expandir o processo de produção, pensar as moradias e a organização do trabalho individual e coletivo. Para isso, tem sido necessário criar espaços de formação e debate, pois é fundamental compreender a posse e uso da terra dentro das diretrizes do PDS e da formulação da Reforma Agrária Popular construída pela MST.
Superar esses desafios só é possível na ousadia, na vontade, resistência e com apoio dos diversos parceiros institucionais, principalmente das universidades. Como diz a Prof. Katia Marro da UFF de Rio das Ostras, “talvez eles não o saibam, mas essa teimosia impregnou nossas agendas de trabalho e pesquisa, nossas preocupações cotidianas como sujeitos universitários”, é o que relata Kátia. E muitos outros que acreditam na liberdade do povo, na Reforma Agrária.
Recordando a História de Luta
No dia 7 de setembro de 2010, cerca de 300 famílias se organizaram e ocuparam um latifúndio improdutivo e com várias denúncias de desmatamento. A Fazenda Bom Jardim na época era de propriedade da Rádio Difusora, pertencente de Barbosa Lemos, ex-deputado estadual e ex-prefeito de São Francisco de Itabapoana-RJ.
Neste dia, 7 de setembro. Todos vão para as ruas uns comemorar a tal da “Independência”, outros, como nós, tomamos as ruas para reivindicar nossos direitos, essa tal “Independência” que tanto nos é negada, no Grito dos Excluídos.
Até a conquista da terra, foram anos marcados por muitas lutas, sofrimento e resistências das famílias do MST, e a luta e o sofrimento não tardaram a chegar. O despejo do Acampamento Osvaldo de Oliveira se realizou no dia 17 de novembro de 2010, e as famílias passaram por um dia tenso e de desrespeito aos direitos humanos por parte do poder público. Eram mais de 250 agentes da PF e da PM: “Era mais polícia do que gente, companheiro!”, é uma fala corriqueira que se costuma ouvir das famílias que estavam naquele fatídico dia. O despejo passou, mas a luta continuou.
As famílias começaram então uma peregrinação para encontrar um pouso para poder descansar e se organizar para os próximos passos da luta. De baixo de chuva foram jogados de um lado para o outro pelo poder público e seus agentes repressores, até que conseguiram com a Igreja um lugar para descansar e se reorganizar para os embates que viriam. Com a ajuda do Padre Mauro, conseguiram ficar em Virgem Santa, área da Igreja ainda em Macaé.
A luta não acabou e corajosos como somos, trabalhadores e trabalhadoras Sem Terra, fomos para uma área pública à beira da linha férrea, no bairro de Califórnia em Rio das Ostras. Área fica no limite com o município de Macaé. As famílias começaram a se preparar para voltar a ocupar a fazenda. Foram muitas lutas no INCRA, no Fórum e mais onde fosse necessário estar.
Nessa época começaram a discutir uma ocupação diferenciada da área, já que tinha inúmeras denúncias de desmatamento na fazenda e desrespeito ao meio ambiente. Com trabalho intenso de formação avançamos na proposta do PDS (Projeto de Desenvolvimento Sustentável). O PDS é uma modalidade de assentamento em alternativa ao modelo convencional, com uma proposta diferenciada de matriz de produção, agroecológica, e ocupação em harmonia com o meio ambiente, apropriação coletiva da terra e proteção da mata.
Com a ação em conjunto da UFF – Rio das Ostras, parceira do MST e do Osvaldo de Oliveira desde sua ocupação, e dos Setores de Formação e Produção, as famílias começaram um importante processo de formação em agroecologia e organização coletiva.
Nessa relação firmamos parcerias concretas e solidárias com os companheiros da UFF Campus Rio das Ostras, do SindiPetro-NF, Marcel, Danilo, Pe. Mauro, André… Tantos em tanta caminhada, por que sozinhos sabemos que não damos conta.
Mas toda luta gerou frutos, e depois de tanta, dor, sofrimento e resistência veio a tão sonhada conquista. Todos foram protagonistas dessa história. Todos mesmo. Cada qual com sua contribuição em algum momento, ou em alguns. E quão bonito ficaram todos juntos, se enxergando. Mas nessa história tem um simbologia importante, o Osvaldo que virou o nome do assentamento.
Osvaldo foi um grande lutador, desses que não desistem fácil de uma boa briga. Sempre ao lado do povo. Tinha um lado bem definido. Ocupava terra, fazia atos, se mobilizava. Ocupou os espaços do sindicato rural e de lá continuou tendo um lado. E esse lado sempre era o lado do povo. Um companheiro assim a gente costuma não deixar morrer, não damos descanso. A luta não para.
2017-12-21 » alantygel