Breve análise sobre a Colômbia, a questão da militarização e a violência contra mulheres.
terça-feira 26 outubro 2010 - Filed under Notíciais Internacionais e da Via Campesina
Amanda Matheus- Direção Nacional do MST-RJ
A Colômbia tem 45 milhões de habitantes e é o terceiro país mais populoso da América Latina, depois do Brasil e México. Está entre os 10 países mais desiguais do Mundo, com um alto índice (46%) de pobreza e desigualdade. No campo, 43% da terra está concentrada, resultando num alto índice de desigualdades: 16.352 proprietários (0,4%) são donos de 62,6% da terra em propriedades maiores a 500 hectares; e 3.223.738 proprietários (86,3%) são donos de 8,8% da terra nas propriedades menores de 20 hectares.
Na Colômbia, a Reforma Agrária não ocorreu. Pelo contrario, vem ocorrendo um processo de contra-reforma agrária, aumentando a violência (desplazamentos forçados) no campo, com objetivo de fortalecer a grande propriedade. Nos últimos anos foram tirados violentamente 5,6 milhões de hectares de terras dos campesinos. A maior parte delas segue nas mãos dos paramilitares e narcotraficantes, que reforçam a grande propriedade. O índice GINI de desigualdade no campo aumentou um pouco mais de 1% nos últimos cinco anos, passando para 0,889 (quanto mais perto de 1, mais desigual).
Na Colômbia, além da concentração da terra, estão em curso os mega-projetos conduzidos por empresas multinacionais estrangeiras que atuam principalmente na exploração de matérias-primas. As principais matérias-primas exportada são: petróleo, carbono, ouro e gás natural. Mais de 50% da exportação do país no ano passado no país foi de petróleo e carbono.
Outro elemento central na Colômbia é a política de militarização, implementada pelo governo colombiano e dos EUA. A militarização tem sido uma estratégia dos EUA para exercer um controle econômico, social, político e ideológico no mundo e na America Latina. A presença de militares dos EUA na Colômbia vem desde muitos anos, e faz parte da estratégia de dominação estadunidense nos países da America Latina.
Os governos colombiano e norteamericano adotaram acordos militares bilaterais, através da estratégia do chamando Plano Colômbia. Este plano é uma aposta armamentista e de militarização norte-americana, que tem por objetivo a instalação de bases militares norte-americanas no território colombiano e em outros países da America latina. Com isso, pretendem avançar na ocupação dos territórios latino-americanos.
Para justificar essa política de militarização, o governo colombiano utiliza o discurso da política de segurança democrática na luta contra o narcotráfico e o terrorismo. Em nome dessa segurança democrática, os EUA e o governo local avançam sobre o controle do território colombiano, reforçando a militarização através das forças legais ligadas ao aparato do estado como policia e o exército, e as forças ilegais (os paramilitares), que controlam as terras dos campesinos e indígenas.
Além disso, o governo colombiano Uribe firmou com governo Barak Obama em 2009 um acordo militar, em que permite que os EUA utilizem sete bases militares e instale outras em território colombiano.
As novas bases que começam a funcionar dentro da lógica do acordo bilateral são aéreas e marítimas: Base Aérea de Apiay, no estado de Meta; Base Aérea de Malambo, área metropolitana de Barranquilla; Base Aérea de Palanquero, situada em Puerto Salgar; Base Aérea de Tolemaida, em Lelgar Tolima; Base Naval de Bahia Málaga, no Pacífico colombiano, em Boaventura; a Base Naval de Cartagena. A estas, se somam outras 3 que vêm sendo utilizadas por soldados dos EUA: A base aérea de Três Esquinas, no estado de Caquetá, que tem presença de militares norte-americanos e aviões de controle; a base aérea Larandida, no estado de Caquetá; e fala-se ainda na base Naval de Caratagena, que seria incluída nesses acordos. No total, teríamos 6 bases aéreas 2 navais.
Desde o início do Plano Colômbia e o Plano Patriota, as bases militares de Três Esquinas e da Larandia, no estado de Caquetá, vêm sendo utilizadas para a operação de aviões e de inteligência técnica norte-americana. Essas bases permitem controlar a população e aumentar os conflitos, evidenciando as verdadeiras intenções do controle militar dirigido a população civil, resultando em assassinatos e desaparecimentos sob a responsabilidade das forças militares.
Ocorre também uma ampliação da capacidade operativa dessas instalações, o que evidencia o aumento do número de soldados e contratistas militares dos EUA presentes em território colombiano. O fortalecimento operativo da base militar de Palanqueiro reforça a existência militar estadunidense em outras bases da Colômbia, tais como a de Três Esquinas e Tolemaida. Também reforça o controle de zonas de alta biodiversidade, de zonas de possíveis mega projetos de infraestrutura (exploração petroleira). Essas novas bases têm a tarefa de permitir que empresas multinacionais e os grupos empresariais colombianos desfrutem destes recursos.
Outro elemento importante a ter em conta é o logístico, operativo e militar destas Bases, que a partir dos acordos militares, buscam instalar na Colômbia a antiga Escola das Américas e outros tipos de treinamento militar dos EUA para exércitos latinoamericanos. Há todo um acordo para aumentar os procedimentos conjuntos, logística e equipe, capacitação e instrução, fortalecimento da capacidade de reconhecimento e monitoramento, exércitos conjuntos e especialmente intercâmbio de informação de inteligência. O objetivo desses acordos é estender os manuais de procedimento militar dos EUA em exércitos como o colombiano. Esses acordos militares para resgatar a Escolas das Américas fazem parte da estratégia de controlar a guerrilha colombiana e as outras organizações políticas na Colômbia e na America Latina, que seguem contra a política norte-americana.
O papel do estado colombiano tem sido reforçar a política de militarização, na medida em que reforça as forças legais do aparato estatal como a polícia e o exército, e também reforça as forças ilegais como os paramilitares, que controlam cada vez mais territórios e populações, e reforça o conflito armado.
Do ano de 2002 a 2008, o governo de Uribe gastou mais de 120 bilhões de pesos (60 milhões de dólares) em aparato militar do Estado. Em 2002, as forças militares possuiam 280 mil integrantes; em 2010, esse total chega a 456 mil. Outros dados mostram que 56% dos salários pagos pelo governo nacional estão destinados para pagar essas forças de segurança. O PIB da Colômbia é investido mais em gastos militares do que em saúde, educação e habitação.
A militarização é responsável pela injustiça social no país. O presidente Uribe, em 8 anos de governo, em nome da segurança nacional com discurso de ajuda humanitária para encobrir a militarização, adotou uma política de guerra e invadiu os territórios dos povos indígenas, campesinos e afro-colombianos. O conflito aumenta a pobreza, a injustiça e as mortes, além de concentrar a riqueza.
Nesse contexto de conflito armado, a população é a que mais sofre as conseqüências, como assassinatos e desplazamentos de terras de campesinos e indígena. As mulheres são as que mais sofrem com esses conflitos.
A violência contra as mulheres pode ser observada no Encontro Internacional de Mulheres e Povos das Américas contra a Militarização, que ocorreu entre 16 e 23 de agosto, na Colômbia. O evento foi convocado pela Marcha Mundial de Mulheres; Via Campesina; COMPA (Convergência dos Movimentos e Povos das Américas; Conselho Mundial de Paz CMP; Coordinador Agrário Nacional – CNA; PCN (Processos de Comunidades Negras; Movimento Social de Mujeres Contra La Guerra y por La Paz; grupo Compromisso; USD – União Sindical Obrera da industria de Petróleo, Corporación Colômbia de Teatro.
Participaram do encontro movimentos sociais, organizações, e principalmente mulheres de 18 países, tais como Canadá, Espanha, Honduras, México, El Salvador, Brasil, Perú, Paraguai, Argentina e Cuba.
O encontro teve por objetivo denunciar e fazer visíveis os impactos negativos da crescente militarização no continente para a vida das mulheres e dos povos latino-americanos. Foi um espaço para reconhecer e articular diferentes propostas de resistência das mulheres e dos povos a nível local, nacional e internacional, que compartem a proposta pela defesa da soberania dos povos e dos direitos das mulheres a viver uma vida livre de violências. Outro objetivo foi definir uma estratégia para a atuação coordenada pelo movimento de mulheres e dos povos, pela defesa dos territórios, frente a desmilitarização e as bases militares dos EUA.
Este encontro se realizou no contexto de Acordo de Cooperação de Seguridade e Defesa entre os governos da Colômbia e Estada Unidos no ano de 2009, que institucionaliza a presença de militares e contratistas estadunidenses em sete bases militares do território colombiano.
A violência contra as mulheres pode ser constatada principalmente com a realização das Missões Humanitárias de Solidariedade nas regiões da Colômbia, com a participação de delegação internacional que se dividiu entre as regiões: Magdalena Médio e departamentos de Nariño, Valle Del Cauca, Cauca, Santander, Norte de Santander, Atlântico, Bolívar, Antioquia e Cundinamarca, com objetivo de conhecer os conflitos causados pela militarização, os efeitos desses conflitos armados que afetam as comunidades indígenas e campesinas, principalmente as conseqüências desses conflitos na vida das mulheres.
Nas missões observou que 57% das mulheres sofrem com a violência, entre jovens e crianças. A cada dia, 49 mulheres denunciam ser vítimas de abuso sexual. Por outro lado, há muitos casos que não são denunciados por medo. A violência se dá principalmente sobre o corpo das mulheres, com os abusos sexuais (estupro), assassinatos, recrutamento de seus filhos e promessas de trabalho. As mulheres têm medo de assumir cargos, coordenações, pois seus maridos e filhos sofrem ameaças de morte. São muitos os casos de violência com as mulheres, mas a maioria não é dito por causa do medo.
O Encontro encerrou com a participação com uma vigília na Base Militar de Palanquero, situada em Puerto Salgar. A vigília aconteceu nessa base, pois é uma base estratégica para os EUA, já que está situada em uma região central da Colômbia que dá acesso fácil às outras bases militares. Ela também é estratégica para o controle das bases em outros países da America. Nesta mesma base, foi firmado um acordo para o funcionamento das Escolas das Américas, ou seja, realizar treinamentos militares dos EUA para os exércitos latino-americanos.
Encuentro Internacional de Mujeres y Pueblos de las Americas
2010-10-26 » alantygel
27 outubro 2010 @ 1:43
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