Despejo Violento do Acampamento Osvaldo de Oliveira em Macaé
quinta-feira 25 novembro 2010 - Filed under Notícias do MST Rio
Desde o dia 7 de setembro, cerca de 300 famílias de trabalhadores rurais Sem Terra/MST ocuparam o latifúndio improdutivo Fazenda Bom Jardim de 1.650 ha, no distrito de Córrego do Ouro, município de Macaé-RJ. A proprietária é a empresa de rádio Campos Difusora Ltda, do norte fluminense. A área é arrendada para José Antonio Barbosa Lemos, curiosamente o sócio-proprietário da mesma empresa (Campos Difusora), também ex-deputado estadual e ex-prefeito de São Francisco de Itabapuana. Tal fato já coloca em questão quem são os proprietários de terra em nosso país.
A área possui decreto presidencial, que declara o interesse social para fins de reforma agrária. Historicamente trata-se de uma propriedade que não cumpre com a função social, que se agrava diante das denúncias feitas ao IBAMA pelas famílias Sem Terra de desmatamento na área de reserva ambiental realizada pelo próprio proprietário, Barbosa Lemos.
Apesar de a fazenda descumprir totalmente com a Constituição (a função social e desmatamento), o Poder Judiciário Federal de Macaé, a Juíza Dra. Angelina de Siqueira Costa, determinou a reintegração de posse imediata, dando poderes para que a mesma se realizasse inclusive nos finais de semana e mesmo após o horário forense. Este fato também nos mostra a parcialidade das ações judiciais da mesma.
As violações pelas quais as famílias passaram se iniciam com a decretação de segredo de justiça do processo, não permitindo que a assessoria jurídica das famílias, bem como a procuradoria do próprio INCRA, que é parte também do processo, pudesse acessar os autos na integralidade e assim preparar suas defesas.
O despejo do Acampamento Osvaldo de Oliveira se realizou no dia 17 de novembro e as famílias passaram por um dia tenso e de desrespeito aos direitos humanos por parte do poder público. A Polícia Federal e Militar, comandada pelo Delegado da Policia Federal Escobar, não seguiu em momento algum as orientações do Manual de Diretrizes Nacionais para Execução de mandados judiciais de manutenção e reintegração de posse coletiva da Ouvidoria Agrária do Ministério do Desenvolvimento Agrário/MDA. Este manual faz parte do Plano Nacional de Combate a Violência no Campo, que é coordenado pelos Ministérios de Desenvolvimento Agrário, Meio Ambiente, Justiça e Secretária Especial de Direitos Humanos, que visam evitar violências nas ações de reintegração de posse.
A polícia Federal, Militar, a Justiça e a Prefeitura de Macaé demonstraram a pior face da criminalização da pobreza e dos movimentos sociais pelo poder público, impondo um quadro de violações de direitos fundamentais das famílias que sofriam o despejo. As “autoridades” que se encontravam estavam apenas resguardando os interesses do proprietário e não a integridade das famílias. A ordem era que as famílias fossem retiradas imediatamente e seus pertences descartados, não havendo por parte do delegado preocupação de deslocar as famílias para um local apropriado.
Os mais de 250 agentes da PF e PM davam de 10 a 30 minutos para as famílias retirarem todos os seus pertences e desmontarem suas moradias, sob ameaça de uma retro escavadeira destruir as moradias ou de incendiarem os pertences. Os moradores, inclusive as crianças, foram colocadas na carroceria das caminhonetes e transportadas até a saída da fazenda, sem saber para onde seriam encaminhados. Alguns moradores foram atacados por gás de pimenta.
É importante expor que as famílias, mulheres, grávidas, senhoras, homens, jovens, idosos e crianças cumpriram ordem de despejo sem emitirem nenhum tipo de resistência e foram obrigadas a ficarem expostas a uma noite chuvosa sem abrigo.
Representantes da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Macaé foram destratados pelo Delegado da Policia Federal Escobar que chefiava a operação. Após se apresentarem, assessores Marcel Silvano e Magnum Tavares ouviram do Policial alguns desrespeitos que configuram um exagerado abuso de poder. Uma das falas foi da seguinte forma a seguinte:
“Ah, vocês estão aqui, então vamos ajudar, vamos trabalhar. Bota as coisas em cima do carro e vamos deixar todo mundo lá na Câmara, vocês querem?”
Um deles, inclusive quase foi retirado a força da área pelos polícias pelo fato de estar fotografando e filmando, sob acusação de que usaria as imagens contra os agentes da PF. A forma ríspida de tratamento e o humor alterado se repetiram com a procuradoria do INCRA e com representantes da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro/ALERJ.
O Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, vereador Danilo Funke/PT tentava uma autorização do Prefeito ou de algum responsável pelo parque para que as famílias pernoitassem junto a suas coisas. “Esgotamos todas as tentativas. A prefeitura pode até ser contra o movimento, mas é obrigação zelar pela vida e o bem estar das pessoas. A proposta era apenas uma noite e foi negada com veemência”, declarou o único vereador de oposição da cidade.
Sem conquistas por parte das famílias às 23h, a Polícia Federal deu 30 minutos para que todas as famílias saíssem do parque e levassem tudo. O clima ficava cada vez mais tenso e as famílias desesperadas, não haviam comido nada durante o dia e o cansaço era evidente.
As famílias ficaram das 8 da manhã até a madrugada do dia seguinte em meio a chuva, sem se alimentar, sofrendo os abusos constantes dos policiais que freqüentemente gritavam para os militantes que tentavam organizá-las, evitando assim o caos do isolamento imposto pelas autoridades policias.
“O choro das crianças e a angústia dos mais velhos eram assustadores”, comenta Marcel, assessor do vereador.
O impasse só foi resolvido quando Padre Mauro da Igreja Católica de Macaé, que também acompanhou toda a ocupação e o despejo, se propôs a receber as famílias por alguns dias no espaço da paróquia na localidade de Virgem Santa. Já a prefeitura da cidade não permitiu, sequer, que mulheres e crianças dormissem no Parque de Exposições da localidade (área publica) aquela noite.
A única mídia presente foi o Jornal O Diário de Macaé. A Rádio e a TV Difusora contavam com a presença de uma caminhonete Toyota Hillux que servia lanche com Coca Cola aos Policiais Federais, Militares e ao Conselho Tutelar de Macaé. Mais um fato que mostra como a burguesia reacionária da região tem tudo no sob seu controle.
Dentre as violações deste despejo temos:
1) O impedimento que as famílias pudessem retirar todos os seus pertences;
2) Atearam fogo em todos os barracos, em alguns casos com pertences que não foram possíveis de serem retirados em razão do limite de tempo imposto pela autoridade policial e de infra-estrutura, como caminhões, por exemplo;
2) Não informação de todos os órgãos públicos necessários para evitar conflitos e possibilitar uma mediação onde as famílias tivessem seus direitos reconhecidos;
3) Não houve nenhuma preocupação em garantir o local de destino das famílias, sendo apenas apontado um local para os seus pertences;
4) O Conselho Tutelar, que deveria resguardar a integridade das crianças, ficou durante toda reintegração abrigado num dos barracos, se omitindo de garantir o direito das famílias alimentarem suas crianças;
5) Abuso da autoridade policial, com uso de violência, que impediu a filmagem por parte de organização social ali presente, bem como, no impedimento inicial da permanência do mesmo representante no local da reintegração;
No dia 19 de novembro as famílias se encaminharam para outra localidade e saído do pátio e das dependências da Igreja. “Fizemos a nossa parte de acolher aquelas famílias que foram negadas por todas as estruturas de governo. Crianças, idosos e gestantes não poderiam dormir na rua de forma alguma. Não temos o melhor espaço, mas somos solidários ao desespero e a luta das famílias por terra e justiça social” declarou Padre Mauro.
É vergonhoso que em pleno século XXI famílias de sem terra sejam tratadas como não cidadãos, sem nenhum direito, sem dignidade.
Nós do MST agradecemos a solidariedade prestada de todas as pessoas e entidades que se envolveram no Acampamento Osvaldo de Oliveira desde a ocupação até o seu despejo e que se posicionam nesta luta junto as nossas famílias Sem Terra.
“Só temos uma certeza, seguiremos lutando e ocupando latifúndios enquanto ainda existir famílias excluídas da terra querendo na terra trabalhar e viver”.
2010-11-25 » alantygel
25 novembro 2010 @ 8:29
[…] Leia mais… […]
25 novembro 2010 @ 12:48
Esta na hora da nossa Presidente Dilma adotar o projeto
” Módulo Raizes do Rio” , será um grande protótipo para o resto da Brasil , projeto este , que já se encontra desde 2005 na Documentação Histórica da Presidencia da República , os cofres estão abarrotados de verbas para estas finalidades , vamos construir cidade novas com lotes rurais nas periferias para gerar economia familiar que produzirá a renda necessária para uma família e servirá como abastecimento de alimentos as cidades próximas .Não necessitamos de invazões, temos muito dinheiro para pagar as áreas escolhidas para a implantação dos Módulos . Senhora Presidenta Dilma é só querer fazer !
26 novembro 2010 @ 0:50
Se cada “autoridade” se colocasse no lugar daquela pobre gente antes de tomar atitude tão cruel, pensaria duas vezes…ou não. Autoridades que moram bem, comem bem, dormem bem, têm bons empregos têm força para jogar no lixo famílias inteiras. O Padre, pelo menos abrigou-os e pode muito bem aproveitar para mandar uma mensagem ao Papa pedindo que abra mão de um pouco do ouro que o veste e o abriga e mande para ajudar as criancinhas, de que tanto fala, mas que durante tanto tempo negou-se por elas a fazer justiça. É muita desigualdade!!
1 dezembro 2010 @ 10:14
Sou estudante da UFF/PURO em Rio das Ostras, aluna do Serviço Social e estou acompanhando junto com a universidade a ocupação.
Fico plenamente indignada contudo o que aconteceu, e me pergunto onde isso vai parar! É impugnante a forma como essas famílias foram tratadas.
Fica assim minha solidariedade e indignação a tudo o que aconteceu!
28 dezembro 2010 @ 20:14
[…] ao longo dos últimos 8 meses o trabalho escravo, os despejos, a violência policial, o avanço dos agro- tóxicos e negócios, os crimes ambientais e o […]
12 janeiro 2011 @ 23:39
[…] sofrer um violento despejo determinado pelo Poder Judiciário Federal de Macaé, especificamente pela Juíza Angelina de […]
12 janeiro 2011 @ 23:41
[…] sofrer um violento despejo determinado pelo Poder Judiciário Federal de Macaé, especificamente pela Juíza Angelina de […]
14 agosto 2012 @ 22:50
[…] é bastante tensa. O sem-terra Roberto conta que o acampamento já sofreu quatro desepejos: “Um deles foi uma coisa absurda. Foram 240 homens da Polícia Federal, vinte da PM. Tiraram o povo de maneira arbitrária, […]
28 fevereiro 2014 @ 16:46
[…] Comprovando a tese de que a reforma agrária no Brasil só acontece através da luta, os acampados e acampados do Osvaldo de Oliveira tiveram de ser muito persistentes para alcançar a conquista da terra. O acampamento passou por 4 despejos, sendo um deles muito violento. As 300 famílias que ocuparam a fazenda sofreram um revés 3 meses depois. Policiais deram 30 minutos para que as famílias saíssem, e queimaram todos os barracos em seguida, ainda com pertences dentro. Todos os Sem Terra, incluindo mulheres e crianças, dormiram ao relento até serem acolhidos pela igreja local. Veja mais sobre este despejo. […]
25 julho 2016 @ 13:46
[…] Despejo Violento do Acampamento Osvaldo de Oliveira em Macaé […]