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Escola de Serviço Social da UFRJ recebe os estudantes do MST

quarta-feira 23 março 2011 - Filed under Notícias do MST Rio

Por Alan Tygel

ServiçoSocialMST

No último dia 15 de março, a Escola de Serviço Social da UFRJ (ESS/UFRJ) deu as boas vindas aos seus mais novos alunos: 60 militantes do MST e de outros movimentos sociais do campo, matriculados na turma especial para assentados da reforma agrária. O curso, viabilizado pelo PRONERA (Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária), finalmente se inicia, fruto da articulação entre MST, INCRA (executor do PRONERA) e ESS/UFRJ.

Os alunos, vindos de 20 estados do Brasil, terão cinco anos de curso em regime de alternância, ficando 8 semanas em aulas, e 3 meses em suas atividades normais. Esta não é a primeira vez que a ESS/UFRJ é pioneira em ampliar o acesso à ainda elitizada UFRJ: o Serviço Social foi o primeiro curso da universidade a ter uma turma no período noturno, possibilitando a participação efetiva de trabalhadores neste espaço. Veja o depoimento de Marina dos Santos, uma das alunas do curso.

A aula inaugural do ano de 2011 foi proferida por José Paulo Netto, professor aposentado da escola, mas que fez questão de estar presente neste momento. Antes disso, uma mesa composta Marcelo Braz (professor da ESS), Marcelo Correa (decano do CFCH), Mavi Rodrigues (diretora da ESS), Maristela Dal Moro (coordenadora do curso de Serviço Social), Joana Motta (representante do CA), Rosane Rodrigues (INCRA) e Geraldo Gasparin (coordenação pedagógica da ENFF) saudou os novos alunos, contando um pouco da história da construção deste curso.

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Mesa de Abertura: Geraldo Gasparin (ENFF), Mavi Rodrigues, Marcelo Correa (CFCH/UFRJ), Marcelo Braz (ESS/UFRJ), Maristela Dal Moro (ESS/UFRJ), Joana Motta (CA), Rosane Rodrigues (INCRA)

O auditório completamente lotado denunciava que alí ocorria um evento histórico. “Estou a 31 anos na Universidade, e raríssimas vezes ví este auditório cheio”, disse Marcelo Macedo, que também representava o reitor. Mavi Rodrigues ressaltou o elitismo da universidade pública brasileira: “No Brasil, menos de 5% dos jovens têm acesso à universidade pública; destes, pouquíssimos são filhos de trabalhadores urbanos; e menos ainda, filhos dos trabalhadores rurais.” Mavi exaltou ainda a parceria entre os diversos atores desta empreitada: o MST, que forçou a entrada dos camponeses na universidade, o INCRA, que executa o PRONERA, o CA, que ajudou na luta contra as resistências internas, o CFCH, que foi a primeira porta de entrada para camponeses através de um curso de extensão, e o reitor Aloisio Teixeira, que foi um grande aliado na derrubada dos obstáculos jurídicos e burocráticos deste processo. E finalizou: “A entrada de trabalhadores rurais no campus universitário é comparável ao corte da cerca do latifúndio”.

Maristela Dal Moro colocou o curso como a materialização de um sonho coletivo. Segundo ela, receber alunos de 20 estados, sendo 60% mulheres, do MST, Movimento de Pequenos Agricultutores (MPA) e do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), é um mais um marco na luta pela ampliação do acesso à universidade. E deu ainda as boas vindas ao alunos do curso noturno, que ingressaram via SISU, no primeiro vestibular com cotas sociais da UFRJ. Veja entrevista com Maristela Dal Moro. A representante do Centro Acadêmico, Joana Motta, vê no momento histórico a tentativa de popularizar a universidade, direcionando seu foco para os trabalhadores e não para as grandes empresas.

Representando o INCRA, orgão executor do PRONERA, estava Rosane Rodrigues: “Como agente público, é muito gratificante ver um projeto saindo do papel e chegando à ação, chegando à população. Depois de tantos “chás de sofá”, o sonho se concretiza, e honra o trabalho do agente público.” Rosane ressaltou que o PRONERA continua sob responsabilidade do INCRA (e não do MEC) por força dos movimentos sociais, que exigem uma educação diferenciada para os povos do campo. O desafio agora, segundo ela, é transformar o PRONERA em política pública, e não aceitar mais escolas urbanas no campo. E finalizou: “acompanharei o curso como fiscalizadora do INCRA, mas também como militante.” Veja entrevista com Rosane Rodrigues.

Geraldo Gasparin, da Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), finalizou: “Colocar os trabalhadores nas malhas escolares, trabalhar pela formação da classe trabalhadora, isso é parte da nossa luta.” Segundo ele, hoje existem cerca de 50 turmas de assentados da reforma agrária em andamento, com mais de 3000 graduados ou graduandos em todo o país. Veja entrevista com Geraldo Gasparin.

Aula inaugural MST 125

Foto: Cícero Rabello

Ao final da mesa, foi apresentada uma mística feita por ex-alunos da escola, e outra feita pelos ingressantes. Veja o vídeo da mística.

A aula do mestre Zé Paulo Netto foi o momento mais rico da noite. Nada mais simples, e ao mesmo tempo relevante, do que falar sobre a história do Serviço Social, e seu panorama hoje no Brasil e no mundo. Segundo ele, o Brasil hoje é o segundo país com mais assistentes sociais no mundo: 90 mil, perdendo apenas para os EUA. Com a expansão do ensino superior privado a partir do governo FHC, cursos de baixo custo (ou seja, “cuspe e giz”) se proliferaram de maneira muito veloz: de 60 cursos de Serviço Social em 1997, passamos a 250 hoje, com qualidade variando de ruim a péssimo. Mas Zé Paulo ressalta: o curso da UFRJ está entre os cinco melhores do Brasil. E recomenda a leitura do código de ética brasileiro da profissão: “É o mais avançado do mundo”.

No contexto histórico, Zé Paulo diz que o Serviço Social chega ao Brasil pela ‘mão santa’ da Igreja Católica: “Plínio Correia de Oliveira, fundador da TFP, foi um dos primeiros professores de Serviço Social do Brasil”. A profissão surge em nosso país no momento em que não se podia mais tratar a “questão social” como caso de polícia. Neste caso, a “questão social” vista pelos olhos da classe dominante deveria ser tratada com ações filantrópicas, quase como extensão dos cuidados maternos. Por isso, a profissão ainda hoje tem uma grande maioria de mulheres.

José Paulo Netto - Foto: Cícero Rabello

José Paulo Netto - Foto: Cícero Rabello

A chamada “questão social” é finalmente decodificada pelo professor como a pauperização dos trabalhadores. Diante deste quadro, verifica-se dois grandes grupos de soluções: no primeiro, considera-se que este problema não é passível de solução dentro do modelo capitalista. Ou seja, a solução passa necessariamente por uma ruptura. No segundo grupo, considera-se que boas políticas públicas (bom bolsa-família) podem resolver o problema. E a partir dos anos 1890, foi esse o caminho escolhido. Desta forma, considerando que o estado precisa oferecer políticas sociais para promover o bem-estar social, fica patente a necessidade de um profissional para executar essas políticas. Surge assim a profissão de assistente social.

Mas como é possível que uma profissão com surgimento instrinsecamente burguês, esteja inaugurando hoje uma turma de Serviço Social para assentados da reforma agrária? Zé Paulo Netto responde com clareza e objetividade: luta de classes.

Assim, encerra-se a aula inaugural de 2011 e inaugura-se o primeiro curso de Serviço Social do MST na UFRJ. E que daqui a cinco anos, tenhamos 60 profissionais do Serviço Social atuando em sintonia com os interesses do trabalhadores do Brasil!

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2011-03-23  »  alantygel

Talkback x 2

  1. Turma de serviço social do MST recomeça o tempo-escola | MST Rio
    28 março 2012 @ 0:51

    […] do Brasil. A primeira turma de Serviço Social da Via Campesina iniciou o curso em março de 2011. Veja como foi a aula inaugural. Para Janaína Nogueira Pacheco, 23 anos, do MST da Bahia, este curso “é uma possibilidade de […]

  2. Dalva Felipe de Oliveira
    18 julho 2012 @ 7:52

    Como simpatizante do movimento no estado de Rondônia fico muito feliz com a iniciativa da Universidade Federal do Rio de Janeiro em acolher os campesinas e campesinos.

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Re: Escola de Serviço Social da UFRJ recebe os estudantes do MST







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